- Relicário da Nostalgia
- Autor: Manuel Mar.
- A Derradeira Jornada!
- Foi durante a Segunda Guerra,
- Havia fome lá na minha terra,
- A gente andava desesperada,
- E por causa do racionamento,
- Havia dor e muito sofrimento,
- Toda a gente vivia revoltada,
- E ninguém podia sequer falar,
- Havia bufos sempre a escutar,
- Às ordens da União Nacional,
- Se refilava ia à cadeia parar,
- Todo o povo vivia muito mal,
- Mas tinha que sofrer e calar.
- Eu era ainda menino e moço,
- Quando comecei na jornada,
- Pouco fazia ou mesmo nada,
- Já antes do pequeno-almoço,
- Bem cedo ainda madrugada,
- Eu fazia enorme caminhada,
- Para ir buscar água ao poço,
- E seguia para as filas do pão,
- Acompanhando a minha avó,
- E não se comprava pão-de-ló,
- Ali só havia um pão de rolão,
- Não se podia fazer mais nada.
- E depois do pequeno-almoço,
- Antes do Sol estar a queimar,
- Tocava burro à volta do poço,
- Para tirar água para se regar,
- Tudo o qua havia lá na horta.
- Encaminhava água minha tia,
- A minha avó sentada à porta,
- Que ela trabalhar não podia,
- Com a idade ficou bem torta,
- Mas ainda vivia com alegria,
- Gostava de dar a sua risota,
- Até que chegou o último dia.
- Quando minha avó faleceu,
- Quem mais perdeu fui só eu,
- Pois eu muito dela gostava,
- Sua morte eu não esperava,
- Foi para mim um triste dia,
- De a ver morrer em agonia.
- Tinha então meus sete anos,
- Cheios de vida sem enganos,
- Senti a sua partida ser cruel,
- Não queria saborear esse fel,
- Mas acabei por compreender,
- Quem nasce terá que morrer.
- Torres Novas, 13/04/2016
quarta-feira, 13 de abril de 2016
A DERRADEIRA JORNADA
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